Sumário
descritivo:
Repositório: Biblioteca do Departamento de
Botânica, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade de Coimbra. Localização: Departamento de Botânica Cota: Fundo LC Criador: Luís Carrisso Título: Fundo Luís Carrisso Data(s): 1921-1939 Quantidade: 1 pasta. Resumo: Correspondência recebida pelo botânico Luís Wittnich
Carrisso Informação sobre o modo de aquisição: Pertenceu ao Instituto Botânico. Organização: 47 documentos manuscritos já descritos (1921-1939) Ordenação: Ordem
alfabética dos correspondentes Acessibilidade: Acesso restrito.
Acesso ao espólio (correspondência recebida)
Nota Biográfica
Luís Wittnich Carrisso, nasceu em 14 de Fevereiro de 1886 na freguesia de São Julião, no
concelho da Figueira da Foz (Portugal). Filho de Inácio Augusto Carrisso e de
Leopoldina Neumier Wittnich Carrisso. Terminou os estudos secundários no
Colégio Liceu Figueirense e transitou para a Universidade de Coimbra. Durante a
sua infância, para além da língua materna (alemã), teve formação na língua
francesa, que veio a dominar na perfeição, uma mais-valia que usou para se
relacionar com a comunidade científica internacional.
Durante a sua
formação académica teve o acompanhamento do aristocrata e poeta Conde de
Monsaraz, que muita apreciou os seus dotes intelectuais. O Conde foi uma figura
importante na educação de Wittnich Carrisso. Deu-lhe referências de um trato
social de elevada distinção, fez-lhe despartar a requintada sensibilidade
artística que o caracterizou, bem como o integrou no movimento literário e
político do início do século XX. Como ser social, Wittnich Carrisso foi um
homem bondoso, sempre correcto, bom conhecedor da arte de conversar, delicado e
atencioso para com todos.
De 1904 a 1910
frequentou a antiga Faculdade de Filosofia da Universidade de Coimbra. Concluiu
a licenciatura em Filosofia em 14 de Março de 1910, submetendo-se à difícil
prova de exame de licenciatura, na qual obteve a elevada classificação de 19
valores. Pouco tempo depois, em 22 de Junho de 1911, doutorou-se na Faculdade
de Filosofia Natural, tendo apresentado como dissertação o trabalho “Materiais
para o estudo do plâncton da costa portuguesa” – fascículo I, a lição de
escolha foi subordinada ao título “Estado actual dos conhecimentos acerca dos
restos de fósseis de Neanderthal, Spy e Krapina. Terminou as provas com 20
valores.
No mesmo ano
em que se doutorou, Wittnich Carrisso concorreu para assistente do grupo de
Ciências Biológicas da já então Faculdade de Ciências, apresentando como
dissertação o trabalho “Materiais para o estudo do plâncton da costa
portuguesa” – fascículo II. Foi nomeado para o lugar, de que tomou posse em 17
de Janeiro de 1912 e que manteve até 1918, por ocasião da sua promoção a
Professor Catedrático.
Em 12 de
Janeiro de 1912, Wittnich Carrisso casou com Ana Maria Costa Pereira de Sousa, também
natural da freguesia de São Julião, na Figueira da Foz. Foi o seu único
casamento, do qual não resultou nenhum filho.
Em 3 de Abril
de 1918, Wittnich Carrisso foi nomeado professor catedrático. No mesmo ano,
assumiu também a direcção do Jardim Botânico de Coimbra, por ocasião da
jubilação de Júlio Henriques, que, dada a sua idade avançada, apenas desejava
continuar os seus trabalhos como Naturalista do Instituto. Wittnich Carrisso
ficou a cargo com uma instituição que compreendia o Museu Botânico, o
Laboratório e o Jardim Botânico, que passou a denominar-se Instituto Botânico
Dr. Júlio Henriques. Conservou a direcção do Instituto até à data da sua morte,
em 1937.
Durante a
direcção de Wittnich Carrisso, o Jardim Botânico foi muito enriquecido com
novas plantas, nomeadamente com plantas exóticas africanas, a maioria
originárias de Angola. Desenvolveu as relações com os jardins congéneres, promovendo
trocas de sementes e plantas, reforçando a oferta na publicação do Index
Seminum, que, na época, foi considerado um dos seis melhoras do mundo, dada a
sua variedade e rigor científico. Restaurou as estufas e modernizou o seu aquecimento,
onde passou a cultivar um maior número de plantas exóticas, inclusive a tão
apreciada Victoria amazonica (Poeppig) Sowerby. Introduziu modificações importantes na organização do
Jardim, de forma a que este se prestasse a desempenhar as funções que lhe
competiam: educar o público sob os pontos de vista científico, florícola e
paisagístico; servir de apoio ao ensino da Botânica, na preparação dos alunos
nos campos da taxonomia (plantas vasculares, plantas não vasculares), anatomia,
fisiologia, ecologia e farmacologia; e dispor de instalações onde os
investigadores pudessem manter os materiais necessários às suas actividades de
pesquisa. Disponibilizou mais espaço aberto ao público, plantou grande
quantidade de árvores, devidamente identificadas e etiquetadas com placas, onde
figuravam, os respectivos nomes científicos e vulgares, bem como a distribuição
geográfica da espécie. Também disponibilizou espaço para a instalação de
viveiros e fundou a Escola das Monocotiledóneas. Esforçava-se para obter todos
os recursos necessários a cada um dos serviços do Jardim, evitando a degradação
que o acometeu em épocas passadas.
Wittnich
Carrisso defendia a especialização das ciências para se obter mais rigor.
Assim, na qualidade de director do Instituto do Doutor Júlio Henriques, foi
demarcando a separação de duas linhas de estudos botânico: de um lado, os
estudos citológicos e genéticos, do outro, os estudos morfológicos e
florísticos.
O Herbário da
Universidade de Coimbra lucrou muito com Wittnich Carrisso. Colaborou imenso no
sentido de enriquecer as suas colecções. Procede ele próprio e mandou efectuar
muitas herborizações em Portugal e Angola, não só com o intento de
coleccionador, mas também com a intenção de realizar estudos sobre a flora do
País.
À Universidade
de Coimbra legou Wittnich Carrisso a tradição no estudo da flora africana. O
seu interesse e paixão por Angola, levou-o a empreender três expedições
botânicas a esta país: a primeira, em 1927, centrada em Cabinda e nos distritos
de Lunda, Benguela, Huíla e Moçâmedes; a segunda, curta, em 1929; a terceira,
em 1937, durante a qual a qual acabou por falecer, no deserto do Namibe
(Moçâmedes). Empenhou-se no estudo da flora desta ex-colónia portuguesa, na sua
vertente de Geografia Botânica, tendo organizado grandes colecções de plantas
para herbário, que foi publicando em sucessivas edições do Boletim da Sociedade
Broteriana. Iniciou a publicação do Conspectus Flora Angolensis.
Pelo seu
empenho na resolução dos problemas da colonização portuguesa nas províncias do
ultramar, promovendo as investigações científicas em África, como forma de unir
a metrópole com as colónias, foi-lhe atribuído um lugar no Conselho do Império
Colonial.
Com professor,
Wittnich Carrisso reunia grandes qualidades, ganhando o respeito e a estima dos
alunos. Sabia bem como despertar o interesse pelos estudos botânicos,
envolvendo alunos e professores, como era o caso das conferências que promovia
com professores portugueses e estrangeiros, alguns de grande prestígio
científico.
Apesar de ter
vindo para Coimbra efectuar os seus estudos superiores, nunca esqueceu a sua
cidade Natal. Colaborou e participou em iniciativas para incrementar as suas
atracções turísticas, foi protagonista na fundação da Comissão de Iniciativa e
Turismo, em diversos melhoramentos na Esplanada e na Praia, na fundação do
Ténis Clube e no estudo para a instalação de um campo de golfe, na arborização
da Serra da Boa Viagem e das dunas de Quiaios, bem como no melhoramento das
áreas portuárias, etc.
Sempre deu
grande importância à Universidade Livre e, a seu pedido, foi admitido como
sócio em 4 de Junho de 1929. Em prol desta instituição, participou em várias
palestras, onde discursou sobre a antiga colónia de Angola, o seu tema
preferido.
De 1909 a
1937, o Dr. Wittnich Carrisso publicou 29 trabalhos biológicos, históricos,
biográficos, entre outros. Foi um dos pilares da Sociedade Broteriana na época
pós Júlio Henriques, reestruturando-a, assegurando a continuidade do “Boletim
da Sociedade Broteriana”, com o início da 2.ª Série, e fundando a revista
“Memórias da Sociedade Broterina”, em 1930. Durante a sua presidência, a
Sociedade Broteriana foi uma instituição activa e produtiva, ao serviço da
Ciência e da Botânica.
Era um homem
dedicado à ciência, um botânico dedicado, os seus trabalhos conquistaram o
respeito e a admiração por todo o Mundo. Tornou-se num eminente professor da
Universidade de Coimbra e um notável cientista português. Ao longo da sua vida
ocupou muitos cargos de relevo: Secretário da Faculdade de Ciências
(1917-1919); Director do Museu e Laboratório Botânicos (1919-1922); Director do
Jardim Botânico (1919-1922); Reitor interino da Universidade de Coimbra
(1930-1931); Director do Instituto Botânico (até 1937); Presidente da Câmara
Municipal de Coimbra; Presidente da Comissão de Obras da Cidade Universitária;
Presidente da Junta de Construção do Ensino Secundário e Técnico.
Representou
Portugal em diversos congressos e conferências internacionais. Tomou parte em
diversos Congressos Internacionais de Botânica. O seu gosto pela ecologia era
conhecido e o Governo Português nomeou-o delegado à Conferência Internacional
para a Protecção da Fauna e Flora de África (Londres, 1933). Representou a
Universidade de Coimbra nas festas comemorativas do IV Centenário do Colégio de
França (1931) e nas do III Centenário do Museu Nacional de História Natural de
Paris e Academia Francesa (1935).
A
grandeza das suas qualidades humanas e científicas foi reconhecido ao mais alto
nível, tendo sido apadrinhado com condecorações prestigiantes. Foi Grande
Oficial da Ordem de S. Tiago de Espada, Cavaleiro da Legião de Honra e,
postumamente, foi-lhe concedida a Grã-Cruz da Ordem de Instrução Pública.
Morreu em 6 de
Junho de 1937, no deserto de Namibe (Moçâmedes), em Angola, vítima de síncope
cardíaca, durante a sua terceira expedição botânica aquela país. No local foi
erguido um monumento em sua memória.
Jorge Guimarães
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